O especialista em mobilidade, Antonio Lucio Gil, participará do Encontro Ibero-Americano sobre Desenvolvimento Sustentável
(EIMA 8), na próxima semana em São Paulo. Em entrevista realizada pela
equipe da EIMA 8, Antonio Lucio diz que as cidades precisam saber o que
querem ser, e, em boa medida, saber o que são. Licenciado em Direito, o
consultor foi diretor-geral de Promoções e Disciplina Ambiental da
Comunidade de Madrid. Liderou a área de Meio Ambiente da Candidatura
Olímpica de Madrid 2012, do final de 2003 até julho de 2005. É diretor
da revista Ecosostenible e membro da Comissão de Meio Ambiente do Comitê
Olímpico Espanhol. Antonio Lucio coordena, juntamente com a Rede Nossa
São Paulo, o eixo de Cidades do EIMA 8.
Confira a entrevista.
Quais devem ser as prioridades para acelerar o progresso por um desenvolvimento sustentável nos próximos dez anos?
Antonio Lucio:
As tecnologias existem, os objetivos, os discursos oficiais e as boas
intenções em geral também. Existe oferta de fornecedores e a demanda por
bens e serviços. O que falta é combinar todos esses fatores entre todos
os envolvidos. Isto significa convicção, compromisso, concordância.
Definitivamente, significa governança. Esta governança requer uma
maneira especial para exercer a liderança e para implementar os poderes
públicos (regras, gerentes, contratação, promoção, etc.). Poderíamos
dizer que devem ser novas formas de governança, mas, paradoxalmente, o
que pode ser novo em relação à experiência recente também pode ser visto
como um retorno à ortodoxia do bom governo. O que eu defendo é
transcender os entornos minoritários, elitistas, especializados.
Que
setores econômicos considera que são mais importantes para construir
uma economia verde que colabore com o desenvolvimento sustentável?
Antonio Lucio:
Do ponto de vista subjetivo, o setor público – como o grande criador de
demanda e comprador de bens e serviços – tem uma prioridade fundamental
na promoção do desenvolvimento sustentável. Eu destacaria dois setores,
de naturalidade intrinsecamente urbana: o setor da construção em termos
de reabilitação eficiente de edifícios e bairros me parece o mais
importante, junto com o da mobilidade urbana. Em relação ao primeiro,
cabe destacar um novo paradoxo. Sendo o setor da construção o causador
de muitos desequilíbrios, tem agora a possibilidade de ser líder no
sentido contrário. Este paradoxo, como diz o ditado popular,
aparentemente simples, “é com uma mancha que se remove outra”. Seria,
portanto, um fenômeno curioso da redenção.
Qual é o maior desafio que as cidades enfrentam hoje em dia?
Antonio Lucio:
Saber o que querem ser, e, em boa medida, saber o que são. Pode parecer
existencialista esta perspectiva, mas é disto que se trata. Nós
pensamos que o desafio reside tanto em sacralizar os indicadores
quantitativos (sejam umbrais de contaminação local ou de distribuição
modal no transporte, por exemplo), como em gerar qualitativamente uma
visão e uma ambição – compartilhadas e em consenso – sobre que qualidade
de vida queremos desfrutar no nosso habitat, urbano, é claro. As
cidades têm o privilégio de transbordar talento e recursos para fazer
quase tudo o que pretendem respeitando a elas mesmas.
Concretamente,
em relação à mobilidade, por meio de que políticas e ações se
estabeleceriam estratégias de mobilidade para as grandes e médias
cidades nas próximas décadas?
Antonio Lucio:
Em algum documento do fórum do Conama, anotei a ideia de que não
existem “balas de prata” para a mobilidade urbana, que não se pode
passar recibo para essas infraestruturas que se apresentam como “a
solução”, em nome de uma suposta “eficácia”, que são articuladas e
inauguradas no lapso de um mandato. Frente a esta apelação e
instrumentalização interessada da “eficácia”, se oferece a opção do
“processo”, no qual concorrem as inteligências e os interesses plurais,
inclusive divergentes, para ir avançando nas soluções menos imperfeitas
possíveis e o mais coerentes possíveis.
Definitivamente, para a
mobilidade urbana, como para outras políticas, desconfio dos
pretenciosos exercícios de “racionalidade substantiva”, ou seja, alguém
decide de uma vez o que é bom para todos. Confio mais nos exercícios de
uma procura coletiva e progressiva destas soluções que antes mencionei. O
marco inteligente e adequado para cada caso, que faz possível esta
procura é, no meu entendimento, a principal estratégia (sendo
instrumental) para a mobilidade urbana. Esta “racionalidade de natureza
de procedimentos” é a que, particularmente, se faz mais necessária. Não
obstante, tenho dúvidas se algo assim seja bem recebido em geral por
quem tem o poder. A cultura de governo no nosso país é a de prevalecer a
posição de vantagem institucional, e não fazer concessões de diálogo
aos grupos críticos. Estranho as vezes em que se atua de outra maneira
por convicção.
Qual é a importância de iniciativas como o
encontro EIMA e qual o papel que deve exercer um evento como este num
mundo globalizado, mas com tantas barreiras?
Antonio Lucio: O
EIMA é importante, na minha perspectiva, na medida em que atua como
estímulo exógeno que cria e fortalece capacidades endógenas para a
mudança. As mudanças não se produzirão de forma milagrosa, nem munidas
de “chaves nas mãos” por especialistas estrangeiros. As mudanças virão
de processos vividos conscientemente pelas próprias cidades, a partir
das suas próprias capacidades, da sua quantidade de conhecimento. Às
vezes, estas são ativadas com estímulos externos, em contato com redes
que operam a modo alcaloide. Definitivamente, se trata de gerar
tendências de rendimentos crescentes a partir do caudal de conhecimentos
difusos já existentes. Os clusters são espaços imprescindíveis para
estas dinâmicas e estes clusters precisam ser ativados em intercâmbios
de caudais de conhecimento.
(Agência Envolverde)
No hay comentarios:
Publicar un comentario